Escreveu, no ensaio Ética e Política, Norberto Bobbio, que há duas éticas: a dos princípios e a da finalidade. Esta, a da finalidade, é a que remete seu seguidor a perscrutar as conseqüências dos seus atos, antes da ação. A outra, dos princípios, é a que leve o seu seguidor a não se importar com as conseqüências dos atos que pratica, porque só os pratica se estiverem consonantes com os seus princípios morais.
Não há, aqui, argüir qual delas é a mais conveniente, porque não é esta a finalidade da Filosofia Moral. Bobbio nos deixa claro que é besteira ficar-se imaginando o político agir de acordo com a ética dos princípios… Escreveu, o eminente milanês: “O problema das relações entre ética e política é mais grave porque a experiência histórica mostrou, ao menos desde o contraste que contrapôs Antígona a Creonte, e o senso comum parece ter pacificamente aceitado, que o homem político pode se comportar de modo dissonante da moral comum, que um ato ilícito em moral pode ser considerado e apreciado como lícito em política, em suma, que a política obedece a um código de regras, ou sistema normativo, que não se coaduna e em parte é incompatível com o código de regras, ou sistema normativo da conduta moral”, e cita, no mesmo admirável texto, esta impiedade de Croce: “Outra manifestação da vulgar inteligência acerca das coisas da política é a petulante exigência que se faz de honestidade na vida política”. E por aí vai… Para encerrar esta despretensiosa inserção bobbiana, remato assim: “A ética política se torna assim a ética do político e, como ética do político e portanto ética especial, pode ter seus justificados motivos para aprovar uma conduta que o vulgo poderia ver como imoral mas que o filósofo vê simplesmente como o necessário conformar-se de indíviduo-membro à ética do grupo”. Por imediatamente contemporâneo, não autorizo nenhuma inferência, do que aqui escrevo, que possa me ligar a uma justificativa do que ora se passa, por exemplo, no Senado, porque aquilo é fruto de um sistema pernicioso e permissivo, que vem infelicitando esta República desde a sua infância…
Quem acompanha a telenovela Caminho das Índias, da opositora da outra, assistiu a um inusitado comício político: Puja, intocável, disputa com Opasch, homem de casta, uma vaga parlamentar. Da casa de Opasch sumira um objeto de estimação, ligado à sua crença religiosa, a que se atribuiu roubo perpetrado por Hari, neto da oponente de Opasch, com que estava o tal objeto. Em face dos princípios que ditam as condutas morais daquele povo, aí estava a oportunidade de Opasch, denunciando publicamente o roubo, no palanque do comício, reverter, em seu favor, a eleição, que já considerava ameaçada pelo crescimento de sua oponente. Certo do roubo, estava decidido, e faria a denúncia. A oponente, orientada, para não expor, ainda mais, o menino, preferiu retirar a sua candidatura. É neste exato momento que o Brasil, que não lê, que não estuda, ficou sabendo distinguir as éticas. Anusha, neta de Opasch, em que se manifestou o luminoso sentimento do primeiro amor, esse que surge na madrugada da existência, vai ao ouvido do avô e lhe confessa que foi ela que deu aquele objeto ao menino: ele não o roubara! Opasch, então, revela-se não um político, mas um homem que se orienta por princípios morais: não tem porque medir conseqüência, a de colocar em risco a sua eleição, e revela toda a verdade: – esse menino não é um ladrão!
Não sei se essa, de fazer a distinção das éticas, era a intenção da autora, mas, pensando em demonstrar que o político deve agir baseado em princípios morais, o que é um erro, demonstrou, ao cabo, que a sua personagem não será nunca um político.
Escreveu, no ensaio Ética e Política, Norberto Bobbio, que há duas éticas: a dos princípios e a da finalidade. Esta, a da finalidade, é a que remete seu seguidor a perscrutar as conseqüências dos seus atos, antes da ação. A outra, dos princípios, é a que leve o seu seguidor a não se importar com as conseqüências dos atos que pratica, porque só os pratica se estiverem consonantes com os seus princípios morais.
Não há, aqui, argüir qual delas é a mais conveniente, porque não é esta a finalidade da Filosofia Moral. Bobbio nos deixa claro que é besteira ficar-se imaginando o político agir de acordo com a ética dos princípios… Escreveu, o eminente milanês: “O problema das relações entre ética e política é mais grave porque a experiência histórica mostrou, ao menos desde o contraste que contrapôs Antígona a Creonte, e o senso comum parece ter pacificamente aceitado, que o homem político pode se comportar de modo dissonante da moral comum, que um ato ilícito em moral pode ser considerado e apreciado como lícito em política, em suma, que a política obedece a um código de regras, ou sistema normativo, que não se coaduna e em parte é incompatível com o código de regras, ou sistema normativo da conduta moral”, e cita, no mesmo admirável texto, esta impiedade de Croce: “Outra manifestação da vulgar inteligência acerca das coisas da política é a petulante exigência que se faz de honestidade na vida política”. E por aí vai… Para encerrar esta despretensiosa inserção bobbiana, remato assim: “A ética política se torna assim a ética do político e, como ética do político e portanto ética especial, pode ter seus justificados motivos para aprovar uma conduta que o vulgo poderia ver como imoral mas que o filósofo vê simplesmente como o necessário conformar-se de indíviduo-membro à ética do grupo”. Por imediatamente contemporâneo, não autorizo nenhuma inferência, do que aqui escrevo, que possa me ligar a uma justificativa do que ora se passa, por exemplo, no Senado, porque aquilo é fruto de um sistema pernicioso e permissivo, que vem infelicitando esta República desde a sua infância…
Quem acompanha a telenovela Caminho das Índias, da opositora da outra, assistiu a um inusitado comício político: Puja, intocável, disputa com Opasch, homem de casta, uma vaga parlamentar. Da casa de Opasch sumira um objeto de estimação, ligado à sua crença religiosa, a que se atribuiu roubo perpetrado por Hari, neto da oponente de Opasch, com que estava o tal objeto. Em face dos princípios que ditam as condutas morais daquele povo, aí estava a oportunidade de Opasch, denunciando publicamente o roubo, no palanque do comício, reverter, em seu favor, a eleição, que já considerava ameaçada pelo crescimento de sua oponente. Certo do roubo, estava decidido, e faria a denúncia. A oponente, orientada, para não expor, ainda mais, o menino, preferiu retirar a sua candidatura. É neste exato momento que o Brasil, que não lê, que não estuda, ficou sabendo distinguir as éticas.
Anusha, neta de Opasch, em que se manifestou o luminoso sentimento do primeiro amor, esse que surge na madrugada da existência, vai ao ouvido do avô e lhe confessa que foi ela que deu aquele objeto ao menino: ele não o roubara! Opasch, então, revela-se não um político, mas um homem que se orienta por princípios morais: não tem porque medir conseqüência, a de colocar em risco a sua eleição, e revela toda a verdade: – esse menino não é um ladrão!
Não sei se essa, de fazer a distinção das éticas, era a intenção da autora, mas, pensando em demonstrar que o político deve agir baseado em princípios morais, o que é um erro, demonstrou, ao cabo, que a sua personagem não será nunca um político.
Fernando Guedes
23.08.2009
Meu caro amigo Fernando, fiquei muito feliz em ver q ainda temos pessoas pensantes escrevendo na internet e q ainda resta uma esperança para esta ferramenta de suporte a educação como parte da aldeia global.
Parabéns e continue escrevendo, pois somos parte da história e ela somente se sustenta quando há registros de qualidade.
abraços
Caro Fernando,
Através de Hilca, colega de Nádia (minha companheira), fui informado deste seu blog. Apesar de não frequentar estes espaços, confesso uma certa repulsa quanto a computadores para exercícios literários, pois trabalhava o dia todo debruçado sobre um e quando chegava em casa, era a última coisa que eu queria ver. Contudo, vejo que seu blog, além de bem estruturado e agradável, apresenta assuntos realmente interessantes. Esta questão da ética, por exemplo, é uma das minhas inquietações quanto a um maior aprofundamento. Já li dois livros específicos: um de Espinoza; o outro, uma coletânea de algumas impressões de diverssos autores. Aliás, as questões filosóficas , para mim, são sempre interessantes.
Assim, parabenizo-o pelo blog e boa sorte nas coisas da vida.
Um abraço.
Aldo
Prezado Aldo,
Obrigado pela gentileza do comentário. Não penso diferente de você: prefiro o livro! Porém, publicar neste país é um tormento, daí a opção pelo Blog.
A Filosofia é o meu grande interesse: está no Blog “Tanatoética, ou a Ética da Meta”, em que medito sobre a morte. Brevemente o Blog será atualizado com a opção de impressão.
Como vejo uma comunhão de pensamento, permita-me indicar-lhe alguns títulos: De André Compte-Sponville – A vida humana; O capitalismo é moral?, O amor a solidão, Bom dia angústia! De Ortega y Gasset: Estudos sobre o amor; El Espectador; A Rebelião das massas; Meditaciones del Quijote.
Um grande abraço.