ago 23, 2009 - Poligrafia    3 Comments

Opasch ou a Ética do Princípio…

Escreveu, no ensaio Ética e Política, Norberto Bobbio, que há duas éticas: a dos princípios e a da finalidade. Esta, a da finalidade, é a que remete seu seguidor a perscrutar as conseqüências dos seus atos, antes da ação. A outra, dos princípios, é a que leve o seu seguidor a não se importar com as conseqüências dos atos que pratica, porque só os pratica se estiverem consonantes com os seus princípios morais.

Não há, aqui, argüir qual delas é a mais conveniente, porque não é esta a finalidade da Filosofia Moral. Bobbio nos deixa claro que é besteira ficar-se imaginando o político agir de acordo com a ética dos princípios… Escreveu, o eminente milanês: “O problema das relações entre ética e política é mais grave porque a experiência histórica mostrou, ao menos desde o contraste que contrapôs Antígona a Creonte, e o senso comum parece ter pacificamente aceitado, que o homem político pode se comportar de modo dissonante da moral comum, que um ato ilícito em moral pode ser considerado e apreciado como lícito em política, em suma, que a política obedece a um código de regras, ou sistema normativo, que não se coaduna e em parte é incompatível com o código de regras, ou sistema normativo da conduta moral”, e cita, no mesmo admirável texto, esta impiedade de Croce: “Outra manifestação da vulgar inteligência acerca das coisas da política é a petulante exigência que se faz de honestidade na vida política”. E por aí vai… Para encerrar esta despretensiosa inserção bobbiana, remato assim: “A ética política se torna assim a ética do político e, como ética do político e portanto ética especial, pode ter seus justificados motivos para aprovar uma conduta que o vulgo poderia ver como imoral mas que o filósofo vê simplesmente como o necessário conformar-se de indíviduo-membro à ética do grupo”. Por imediatamente contemporâneo, não autorizo nenhuma inferência, do que aqui escrevo, que possa me ligar a uma justificativa do que ora se passa, por exemplo, no Senado, porque aquilo é fruto de um sistema pernicioso e permissivo, que vem infelicitando esta República desde a sua infância…

Quem acompanha a telenovela Caminho das Índias, da opositora da outra, assistiu a um inusitado comício político: Puja, intocável, disputa com Opasch, homem de casta, uma vaga parlamentar. Da casa de Opasch sumira um objeto de estimação, ligado à sua crença religiosa, a que se atribuiu roubo perpetrado por Hari, neto da oponente de Opasch, com que estava o tal objeto. Em face dos princípios que ditam as condutas morais daquele povo, aí estava a oportunidade de Opasch, denunciando publicamente o roubo, no palanque do comício, reverter, em seu favor, a eleição, que já considerava ameaçada pelo crescimento de sua oponente. Certo do roubo, estava decidido, e faria a denúncia. A oponente, orientada, para não expor, ainda mais, o menino, preferiu retirar a sua candidatura. É neste exato momento que o Brasil, que não lê, que não estuda, ficou sabendo distinguir as éticas. Anusha, neta de Opasch, em que se manifestou o luminoso sentimento do primeiro amor, esse que surge na madrugada da existência, vai ao ouvido do avô e lhe confessa que foi ela que deu aquele objeto ao menino: ele não o roubara! Opasch, então, revela-se não um político, mas um homem que se orienta por princípios morais: não tem porque medir conseqüência, a de colocar em risco a sua eleição, e revela toda a verdade: – esse menino não é um ladrão!
Não sei se essa, de fazer a distinção das éticas, era a intenção da autora, mas, pensando em demonstrar que o político deve agir baseado em princípios morais, o que é um erro, demonstrou, ao cabo, que a sua personagem não será nunca um político.
Escreveu, no ensaio Ética e Política, Norberto Bobbio, que há duas éticas: a dos princípios e a da finalidade. Esta, a da finalidade, é a que remete seu seguidor a perscrutar as conseqüências dos seus atos, antes da ação. A outra, dos princípios, é a que leve o seu seguidor a não se importar com as conseqüências dos atos que pratica, porque só os pratica se estiverem consonantes com os seus princípios morais.
Não há, aqui, argüir qual delas é a mais conveniente, porque não é esta a finalidade da Filosofia Moral. Bobbio nos deixa claro que é besteira ficar-se imaginando o político agir de acordo com a ética dos princípios… Escreveu, o eminente milanês: “O problema das relações entre ética e política é mais grave porque a experiência histórica mostrou, ao menos desde o contraste que contrapôs Antígona a Creonte, e o senso comum parece ter pacificamente aceitado, que o homem político pode se comportar de modo dissonante da moral comum, que um ato ilícito em moral pode ser considerado e apreciado como lícito em política, em suma, que a política obedece a um código de regras, ou sistema normativo, que não se coaduna e em parte é incompatível com o código de regras, ou sistema normativo da conduta moral”, e cita, no mesmo admirável texto, esta impiedade de Croce: “Outra manifestação da vulgar inteligência acerca das coisas da política é a petulante exigência que se faz de honestidade na vida política”. E por aí vai… Para encerrar esta despretensiosa inserção bobbiana, remato assim: “A ética política se torna assim a ética do político e, como ética do político e portanto ética especial, pode ter seus justificados motivos para aprovar uma conduta que o vulgo poderia ver como imoral mas que o filósofo vê simplesmente como o necessário conformar-se de indíviduo-membro à ética do grupo”. Por imediatamente contemporâneo, não autorizo nenhuma inferência, do que aqui escrevo, que possa me ligar a uma justificativa do que ora se passa, por exemplo, no Senado, porque aquilo é fruto de um sistema pernicioso e permissivo, que vem infelicitando esta República desde a sua infância…
Quem acompanha a telenovela Caminho das Índias, da opositora da outra, assistiu a um inusitado comício político: Puja, intocável, disputa com Opasch, homem de casta, uma vaga parlamentar. Da casa de Opasch sumira um objeto de estimação, ligado à sua crença religiosa, a que se atribuiu roubo perpetrado por Hari, neto da oponente de Opasch, com que estava o tal objeto. Em face dos princípios que ditam as condutas morais daquele povo, aí estava a oportunidade de Opasch, denunciando publicamente o roubo, no palanque do comício, reverter, em seu favor, a eleição, que já considerava ameaçada pelo crescimento de sua oponente. Certo do roubo, estava decidido, e faria a denúncia. A oponente, orientada, para não expor, ainda mais, o menino, preferiu retirar a sua candidatura. É neste exato momento que o Brasil, que não lê, que não estuda, ficou sabendo distinguir as éticas.
Anusha, neta de Opasch, em que se manifestou o luminoso sentimento do primeiro amor, esse que surge na madrugada da existência, vai ao ouvido do avô e lhe confessa que foi ela que deu aquele objeto ao menino: ele não o roubara! Opasch, então, revela-se não um político, mas um homem que se orienta por princípios morais: não tem porque medir conseqüência, a de colocar em risco a sua eleição, e revela toda a verdade: – esse menino não é um ladrão!
Não sei se essa, de fazer a distinção das éticas, era a intenção da autora, mas, pensando em demonstrar que o político deve agir baseado em princípios morais, o que é um erro, demonstrou, ao cabo, que a sua personagem não será nunca um político.
Fernando Guedes
23.08.2009

3 Comments

  • Meu caro amigo Fernando, fiquei muito feliz em ver q ainda temos pessoas pensantes escrevendo na internet e q ainda resta uma esperança para esta ferramenta de suporte a educação como parte da aldeia global.
    Parabéns e continue escrevendo, pois somos parte da história e ela somente se sustenta quando há registros de qualidade.
    abraços

  • Caro Fernando,
    Através de Hilca, colega de Nádia (minha companheira), fui informado deste seu blog. Apesar de não frequentar estes espaços, confesso uma certa repulsa quanto a computadores para exercícios literários, pois trabalhava o dia todo debruçado sobre um e quando chegava em casa, era a última coisa que eu queria ver. Contudo, vejo que seu blog, além de bem estruturado e agradável, apresenta assuntos realmente interessantes. Esta questão da ética, por exemplo, é uma das minhas inquietações quanto a um maior aprofundamento. Já li dois livros específicos: um de Espinoza; o outro, uma coletânea de algumas impressões de diverssos autores. Aliás, as questões filosóficas , para mim, são sempre interessantes.

    Assim, parabenizo-o pelo blog e boa sorte nas coisas da vida.

    Um abraço.
    Aldo

    • Prezado Aldo,

      Obrigado pela gentileza do comentário. Não penso diferente de você: prefiro o livro! Porém, publicar neste país é um tormento, daí a opção pelo Blog.
      A Filosofia é o meu grande interesse: está no Blog “Tanatoética, ou a Ética da Meta”, em que medito sobre a morte. Brevemente o Blog será atualizado com a opção de impressão.
      Como vejo uma comunhão de pensamento, permita-me indicar-lhe alguns títulos: De André Compte-Sponville – A vida humana; O capitalismo é moral?, O amor a solidão, Bom dia angústia! De Ortega y Gasset: Estudos sobre o amor; El Espectador; A Rebelião das massas; Meditaciones del Quijote.

      Um grande abraço.

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